Existe uma agenda tributária que, para especialistas, poderia ser realizada em etapas no curto prazo, mas é atrapalhada pelas eleições. Para os profissionais e até para representantes dos estados, mudanças no sistema seriam importantes neste momento porque ajudaria no crescimento econômico, cujo ritmo está fraco.
“As distorções do sistema tributário brasileiro estão prejudicando tanto o crescimento da economia que em algum momento vai ser inevitável fazer um ajuste. Se isso será no próximo governo, não sei, mas em alguma hora vai cair a ficha para ajustar o sistema”, afirmou ao DCI o ex-secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, atual diretor de políticas públicas e tributação da LCA Consultores.
Na opinião do vice-presidente do Insper, Marcos Lisboa, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, não falta vontade política para realizar as mudanças tributárias necessárias. “Acredito que falta uma vontade do setor privado. Cada um só vê o benefício que recebe”, critica, ao se referir aos regimes especiais, que na visão dele e de outros especialistas, como Appy, é positivo se for em número menor, atingindo quem realmente precisa.
O diretor da LCA comenta que medidas como essa são mais difíceis de ser feitas porque geram custos fiscais. “Sem dar uma sinalização clara que no final vai ter uma redução da carga tributária, vai ser difícil politicamente”, disse, após participar do Fórum Estadão Brasil Competitivo, com o tema Uma agenda tributária para o Brasil, realizado ontem.
Além desse entrave no setor privado, no público tem a chamada guerra fiscal – concessão de benefícios fiscais, como a redução da alíquota do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), dados de forma inconstitucional, porque não tem aprovação unânime no Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).
“Neste caso, eu acho que já chegamos um grau de acordo relativamente grande em relação ao ICMS. No ano passado, teve uma proposta de convênio do Confaz disciplinando o fim da guerra fiscal que não passou porque foi aprovado por 25 estados de 27. Mas é possível trazer esse desenho para um projeto de lei complementar. Aprovar sem a necessidade de unanimidade”, aponta Appy.
O secretário de Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, Renato Villela, um dos participantes do fórum, afirmou que a unanimidade do Confaz é um entrave para soluções rápidas, mas apoia a existência dela porque “traz um salvaguarda para as minorias”. “A guerra fiscal não é uma matéria financeira ou tributária, é uma matéria política. É uma política de desenvolvimento […] A área tributária é secundária nessa situação”, avaliou.
Questionado quando haveria uma retomada das discussões para concluir a situação, o secretário afirmou que em ano eleitoral fica mais difícil uma decisão, mas que as conversas serão retomadas nos próximos encontros, com mais ênfase em 2015. “Acho que estava claro para todo mundo que teria que ser decidido até o final do ano passado”, disse.
Além da proposta de reduzir a alíquota de ICMS para 4% em todas as operações interestaduais cobradas na origem, o convênio que a ser firmado disciplina os incentivos já concedidos, que poderiam existir por 15 anos ou até o prazo final do contrato feito. “Mas isso poderia ser incorporado numa lei federal”, reforçou Appy.
Ele aponta que uma das soluções que podem ser feitas ainda no curto prazo, sem gerar custo fiscal para estados e empresas, é a redução do contencioso tributário. “Aquilo que de fato faz o fisco autuar, continua, e aquilo que o fisco autua e depois de um custo enorme para a empresa e para o fisco acaba perdendo, deve tentar evitar desde o começo de fazer isso”, explica. Segundo ele, só de contencioso federal na esfera administrativa o montante é de R$ 528 bilhões, cerca de 11% do Produto Interno Bruto (PIB).
Pequenas empresas
O diretor da LCA também criticou as regras do regime Simples Nacional. “Do jeito que está, induz a empresa a continuar sendo pequena, o que estimula uma organização ineficiente da economia”, diz. “Obviamente precisa ter uma diferenciação para os menores, mas em função da renda, e não do faturamento. O ideal seria ter um regime tributário que a carga seja crescente à medida que a empresa aumenta sua renda.”
Appy explica que no caso de um eletricista que fatura R$ 36 mil, sem estar no regime simplificado chega a pagar 46,2% em imposto, no Simples o percentual cai para 23,5%, mas se for o dono paga 10,5%. Ainda se for empreendedor individual (MEI), a taxa recua para 1,3%. “Isso faz com que prefira ser pequeno”, aponta.
Fonte: DCI – SP 21/05/2014
Fernanda Bompan