Regime Tributário no Exterior
Se a Lei 12.973/2014 — que põe fim ao regime tributário de transição após a adequação do Brasil às regras contábeis internacionais — trouxe segurança jurídica em pontos como a tributação de lucros excedentes distribuídos a acionistas e a amortização fiscal de ágio gerado na compra de empresas, as determinações sobre lucros no exterior não são promissoras. É o que afirma o advogado Flávio Veitzman, sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados. Para ele, o cenário atual é de confusão, isso porque a nova legislação não é benéfica para quem investe no exterior e na criação de multinacionais.
O assunto foi tema de seminário promovido pelo escritório nesta quarta-feira (21/5). A discussão principal é qual é o momento adequado para tributar os resultados das companhias no exterior. Veitzman cita um exemplo sobre o que ocorre quando há a tributação automática desses resultados. Suponha-se haver uma empresa que desenvolve um mercado fora do Brasil e é tributada em 22% naquela jurisdição.
No Brasil, a tributação é de 34%. A empresa teria tido, nesse exemplo, lucros no exterior, e já teria pago 22% de seus tributos fora do Brasil. Acontece que a legislação brasileira manda a empresa tributar a diferença, ou seja 12%. E a empresa, em vez de reinvestir lucros no exterior, é obrigada a pagar os tributos no Brasil. “Em vários outros regimes de lucro no exterior, o imposto só é cobrado na matriz caso a empresa leve os recursos para lá”, explica o advogado. O advogado critica também o sistema de subcontas que ele aponta como uma “ficção contábil”.
Ou seja, o investidor brasileiro (controladora brasileira) já reconhece como ativo o valor do investimento que ele tem nas subsidiárias no exterior, pelo método da equivalência patrimonial. Entretanto, com a nova regra, o Fisco determina que, além da equivalência, o investidor deve abrir uma subconta, uma espécie de subitem contábil, para especificar qual é o lucro próprio da subsidiária no exterior. Acontece que faz parte dessa equivalência, entre outros, os resultados consolidados e informações sobre se a controlada tem outras subsidiárias.
A crítica é que o Fisco quer evitar a consolidação de lucros e perdas por meio de holdings e também a utilização de tratados internacionais contra bitributação. Isso porque, por exemplo, há situações de holdings na Áustria ou na Holanda que estão submetidas a tratado, enquanto as subsidiárias não estão. Os contribuintes defendem que o Fisco deve olhar para as holdings, que é onde estão os lucros. Para eles, os tratados devem prevalecer sobre a legislação interna e não deve haver tributação automática.
“Com essa subconta, o Fisco quer pegar o resultado próprio da subsidiária de uma jurisdição que não tem tratado e tributar esse lucro. O Fisco quer fazer um contorno na regra do tratado principalmente por essa subconta”, afirmou. Lucros excedentes A maneira como o novo regime trata da tributação de lucros considerados excedentes distribuídos a acionitas e juros sobre capital próprio diminui a insegurança jurídica que existia no passado. Quem afirma é Giancarlo Matarazzo, sócio do Pinheiro Neto Advogados. Segundo ele, a legislação determina que todo lucro deve ser isento de tributação quando distribuída a qualquer acionista.
“O conceito de lucro é contábil. Se há uma mudança no critério de se mensurar o lucro, ele não deixa de ser lucro daquela grandeza. Legitimamente qualquer lucro distribuído tem de ser isento”, afirmou. Na situação atual, há o lucro contábil e o lucro apurado na contabilidade antiga (em vigor até 2007). Essa diferença entre o lucro da contabilidade antiga (apurado no Livro Fcont) e o lucro contábil no balanço normal é o lucro excedente. Com a extinção do RTT, o Fcont deixa de existir e por isso não é mais possível identificar as diferenças da contabilidade antiga para a nova contabilidade.
Antes, o governo até tentou dizer que um pedaço do lucro (lucro da contabilidade antiga) não era isento, mas voltou atrás e reconheceu que de 2008 até 2013 todo o lucro excedente também é isento e eliminou a discussão. A isenção também atinge as empresas que optarem para seguir a nova regra desde já. Já as empresas que não adotarem o novo regime podem ser autuadas pelo Fisco em função da não tributação desse lucro excedente. Entretanto, para Matarazzo, qualquer tentativa do Fisco nesse sentido continua sendo ilegal na medida em que fere o conceito de lucro da Lei 9.249, isso é, fere o direito à isenção. Regras de transição A nova lei muda também as regras de mensuração, alocação e a amortização do ágio.
Essas mudanças geraram a necessidade de criar um prazo de transição para determinar quando as regras passam a valer efetivamente. Por isso, o governo determinou que independentemente da opção pela adoção do resto da medida provisória, quando há uma aquisição de empresa até dia 31 de dezembro de 2014 e depois for feita a incorporação da investida com a investidora até o final de 2017, há a possibilidade de se manter nas regras antigas de amortização de ágio. Então essas regras novas só valeriam para as aquisições feitas as partir de 1 de janeiro de 2015.
Essa medida, segundo Jorge Lopes, também sócio do escritório, é importante, uma vez que as empresas que já estavam negociando as aquisições têm um prazo para se preparar e tem possibilidade de concluir os seus processos até o final de 2014. Se não conseguirem, estarão sujeitas a uma regra nova e devem se preparar para a nova realidade. Ponto importante da nova regra é que antes não havia ordem de alocação do ágio. Por exemplo, havia a possibilidade de alocar para mais valia de ativos, de alocar para expectativa de rentabilidade futura ou outras razões econômicas.
“Hoje, há uma obrigação de primeiro pegar todo o ativo a valor justo da empresa que está sendo comprada e o líquido é retirado e o ágio vai ser o que sobrou da conta. Ou seja, o ágio é a diferença entre ativo a valor justo menos o patrimônio líquido, e o que sobra é o valor de expectativa de rentabilidade futura”, afirmou.