Depois de cinco meses de votação, a Câmara dos Deputados aprovou a redação final do novo Código de Processo Civil (CPC), que substituirá o que foi editado pela ditadura militar há quatro décadas. Com mais de mil artigos, o projeto apresentado em 2009, nos cinco anos em que tramitou no Senado e na Câmara, sofreu profundas modificações, muitas delas decorrentes de sugestões e pressões da magistratura, do Ministério Público, do governo, de entidades empresariais e de associações de procuradores.
A votação na Câmara começou em novembro do ano passado, quando foram aprovados o texto-base da parte geral e os dispositivos relativos ao processo de conhecimento e cumprimento da sentença, procedimentos especiais, execução e recursos judiciais. A votação dos dispositivos mais polêmicos ocorreu nas últimas semanas, quando a Câmara analisou cerca de 40 destaques.
Dos destaques aprovados, alguns introduzem iniciativas importantes para agilizar a tramitação das ações, como a redução do número de recursos judiciais, a valorização da jurisprudência, a adoção de medidas para desestimular a apresentação de recursos com fins protelatórios e a substituição dos embargos infringentes por uma nova técnica de julgamento de apelação e agravo para votos divergentes. Em vez da realização de um novo julgamento, como ocorre hoje, o novo CPC permite a convocação de mais juízes para opinar sobre o processo.
Outros destaques envolvem interesses corporativos, como a absurda concessão, aos advogados públicos, do direito de receber honorários de sucumbência. Atualmente, o valor da sucumbência – que é pago ao governo nas ações judiciais em que é vencedor – vai para os cofres públicos. Pela redação aprovada, que teve forte oposição do governo, a sucumbência será paga aos advogados públicos na fase de recursos.
O projeto do Código, que voltará à apreciação do Senado, uniformiza regras para intervenção judicial nas atividades empresariais. Estabelece parâmetros para que sócios ou diretores de empresas sejam incluídos na execução judicial. Permite que o juiz inscreva os nomes de devedores no cadastro de inadimplentes, a fim de que possam ser protestados em cartório. Atualiza as regras para separação entre sócios de empresas de responsabilidade limitada. Proíbe o bloqueio online de várias contas bancárias da mesma empresa, para evitar que seu funcionamento fique comprometido. E, para evitar abusos, o projeto dá ao juiz o prazo de 24 horas para devolver o valor penhorado que exceder o valor da causa e proíbe que decisões de bloqueio de contas bancárias sejam tomadas em plantões judiciais.
O novo CPC também permite que as partes negociem alguns procedimentos, como agendar audiências, estabelecer prazos e evitar intimações. E, além de estimular os tribunais a criar câmaras de mediação de litígios, converte a audiência de conciliação na fase inicial da ação. Se não houver entendimento, o juiz poderá tentar novamente um acordo durante a instrução do processo. A conciliação também foi convertida em pré-requisito na análise das ações de reintegração de posse que envolvam invasões de terras e imóveis ocorridas há mais de um ano.
Para evitar causas repetitivas, o projeto confere aos tribunais a prerrogativa de suspender ações com o mesmo fundamento, até chegar a um entendimento único sobre o caso, que passa a ser aplicado a todos os processos idênticos. Também permite que os juízes convertam uma ação individual em ação coletiva, nos casos que afetem acionistas de uma empresa ou uma comunidade, com a decisão podendo ser aplicada já na primeira instância. E proíbe a magistratura de prolatar sentenças com base em argumentos jurídicos que não foram discutidos pelos advogados das partes.
A nova legislação ainda não tem data para entrar em vigor. Como este é um ano eleitoral e as corporações derrotadas na Câmara já se mobilizam para reverter a situação, o projeto do novo CPC deve levar algum tempo para ser votado em caráter definitivo pelo Senado.
Fonte: Estadão, 10/04/2014