O comércio teve o mais forte recuo, de 9,9% no ano, em linha com a queda de 3,2% do PIB no período. A saída da recessão passa pela solução da crise política.

De janeiro a setembro deste ano, a economia brasileira declinou 3,2% – na comparação com igual período do ano passado – e já chegou ao número que os analistas do Relatório Focus, do Banco Central, esperam para o encerramento deste ano: uma queda de 3,19% para o Produto Interno Bruto (soma de bens e serviços produzidos pelo país).

A recessão há muito deixou de ser técnica – quando a queda do PIB ocorre por dois trimestres consecutivos – para ser real, ou seja, refletida no cotidiano de empresas, consumidores e do próprio governo. A crise política está exercendo forte influência sobre esse processo.

Na comparação com igual trimestre do ano passado, o recuo foi ainda maior: de 4,5% – o pior resultado para o período desde o início da série histórica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), iniciada em 1996.

Um setor que mais sentiu os efeitos desse movimento na comparação anual, e pelo lado da oferta, foi o comércio, que teve recuo de 9,9%, segundo boletim do Instituto de Economia Gastão Vidigal (IEGV) da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

O setor de serviços, como um todo, contraiu 2,9%. A indústria, que registrou queda de 6,7% por causa da menor produção de máquinas, equipamentos e veículos. A agropecuária, que até então registrava números positivos, teve retração de 2% em razão de fatores climáticos na região Sul.

A queda da confiança das famílias e de empresários respondeu, no lado da demanda, pela redução de 15% nas despesas associadas ao investimento produtivo e em infraestrutura e no recuo de 4,5% no consumo das famílias, segundo o boletim do Instituto.

Apesar da contribuição do dólar – que valorizou-se de mais de 45% no ano – os efeitos foram tímidos sobre as exportações. O dólar alto e a recessão estimularam a redução de 20% nas importações e aumento de apenas 1,1% nas exportações.

“Além da alta dos juros, a desaceleração do crédito, a queda da massa salarial e a elevação do desemprego, a crise política que se instaurou no país passou a ser a variável dominante nesse momento, impedindo o ajuste das contas públicas.

Enquanto o impasse não for resolvido, não é possível pensar em retomada da atividade econômica”, informa o IEGV.

Tanto as turbulências políticas quanto econômicas que o país enfrenta afetam o desempenho da economia, afirmou nesta terça-feira (1º/12) Claudia Dionísio, gerente de Contas Trimestrais da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE. “A turbulência política tem impacto. Só não temos como mensurar quanto foi”, afirmou.

A gerente do IBGE destacou que o órgão não trabalha com o conceito de recessão, mas reconheceu que os indicadores ficaram mais negativos no terceiro trimestre. “No terceiro trimestre, a retração foi maior e generalizada”, resumiu Claudia.

O IBGE evita fazer comentários sobre o desempenho da economia no ano como um todo, pois ainda não tem dados completos sobre o quarto trimestre, mas Claudia admitiu que é esperado que a paralisação da produção da mineradora Samarco desde o rompimento de duas barragens de rejeitos de mineração em Mariana (MG), no último dia 5, afete o PIB da indústria extrativa, que teve o melhor desempenho no terceiro trimestre, pela ótica da oferta, com crescimento de 4,2% ante o terceiro trimestre de 2014.

2º PIOR PIB ENTRE 42 PAÍSES

A manutenção do quadro de recessão fez a economia brasileira registrar o segundo pior desempenho no mundo. O país ocupou, no terceiro trimestre deste ano, a vice-lanterna (41ª posição) do ranking de 42 países que já divulgaram o resultado do PIB no período, apontou a agência classificadora de risco Austin Rating.

A retração de 4,5% na atividade econômica brasileira no terceiro trimestre ante o mesmo trimestre do ano anterior só não foi pior do que o desempenho da Ucrânia, cujo PIB amargou recuo de 7% no período.

No grupo dos quatro piores resultados no terceiro trimestre, em relação ao terceiro trimestre de 2014, figuram ainda Rússia (-4,1%, na 40ª colocação) e Venezuela (-2,3%, 39ª posição). Os demais resultados negativos foram registrados por Grécia (-0,9%) e Taiwan (-0,6%).

O Brasil teve ainda o pior desempenho no grupo dos Brics, em que o destaque foi a Índia, líder absoluta do ranking, com crescimento de 7,4%, seguida pela China, com alta de 6,9%, na segunda posição. Já a África do Sul cresceu 1,0% no período, conquistando o 31º lugar da lista. A Austin Rating prevê queda de 3,5% no PIB brasileiro de 2015 e retração de 2,6% em 2016.

“Se confirmadas nossas estimativas de retração do PIB brasileiro no biênio 2015-2016, esse será o pior desempenho econômico do Brasil em 85 anos. Ou seja, a última vez que o Brasil anotou queda do PIB por dois anos consecutivos foi em 1930 (-2,1%) e 1931 (-3,3%) refletindo, em parte, o crash da bolsa de Nova York em 1929 e o ambiente político nacional conturbado com o fim da oligarquia paulista devido à Revolução de 1930”, ressaltou, em nota, Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating.

INCERTEZAS PIORAM O QUADRO

As incertezas provocadas por fatores que vão além da economia contribuíram para o resultado do PIB segundo o Ministério da Fazenda. Em nota, a pasta destacou que as instabilidades têm estendido o período de correções de rumo na economia brasileira provocado pela piora na conjuntura internacional e pela implementação do ajuste fiscal.

“O desempenho do PIB tem sido, de modo geral, afetado pela incerteza de natureza econômica e não econômica que persiste há vários meses no Brasil, além do natural processo de reequilíbrio pelo qual passa a economia brasileira em consequência da queda dos preços das commodities (produtos primários negociados com cotação internacioanl) e do fraco nível da atividade econômica mundial, com a decorrente queda da confiança de empresas e de consumidores”, ressaltou o comunicado.

De acordo com o Ministério da Fazenda, a intensificação da queda do PIB no terceiro trimestre é resultado da ampliação do processo de ajuste fiscal. No entanto, o ministério apontou aspectos positivos, como o reequilíbrio das contas externas brasileiras provocado pela queda das importações, que levou à recuperação do saldo da balança comercial.

O ministério reconheceu que a retração real de 1,7% no terceiro trimestre veio abaixo do esperado pela Secretaria de Política Econômica da pasta, que estimava queda de 1,1%. A expectativa das instituições financeiras, informou o comunicado, estava em 1,2%. No acumulado dos quatro últimos trimestres, o PIB caiu 2,5%.

*Com Agência Brasil e Estadão Conteúdo

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